Outono Dentro e Fora
12:18Em pé na minha pequena cozinha eu olho através da porta de vidro e observo as folhas amarelas das copas quase vazias das árvores nos quintais dos vizinhos. É outono lá fora e aqui dentro de mim também. Penso nas estações que chegam e vão embora no espaço de 1 ano.
Somos mutantes e mudar é preciso. Mas há momentos que você olha para dentro de você mesma e não gosta do que vê. Folhas amareladas caindo. Dia cinza e gelado. O frescor da primavera e o vigor do verão foram embora.
Pensando sobre isso, percebi que há uma concepção muito errada sobre ser um seguidor de Cristo. Mesmo sem querer, acabo tendo a percepção de que cristão tem que ser perfeito. Sem folhas secas, sem galhos vazios. Apenas folhas verdes, flores e frutos sempre brilhando ao sol quente e balançando com a brisa suave.
Não é fácil olhar para dentro de si mesma e não gostar do que vê. Mesquinharia, egoísmo, discurso de ódio e tantas outras coisas feias que não deveriam fazer parte de mim. Olho para as minhas veias azuis desenhadas na minha pele e vejo pecado correr junto com meu sangue. Como ser um espelho de um Deus perfeito nesse mundo quebrado, sendo tão imperfeita? Como comunicar ao mundo um Deus perfeito, sendo que nem por um segundo eu consigo ser perfeita? Minhas folhas caem e mesmo que eu as tente juntar e colar e me esconder e cobrir meus galhos, elas continuam caindo e o inverno bate à porta me obrigando a me despir do que uma vez brilhou verdejante no fulgor do verão.
Galhos secos à mostra me apresento diante de Deus. Despida, envergonhada, feia. E exatamente nesse momento contemplo a perfeição. Um Deus perfeito que me acolhe em minha feiura, nudez e imperfeição com toda a Sua Graça. Nos seus braços encontro cura, amor e força para mudar aquilo que está feio em mim. Diante Dele não tem como me cobrir, não tem como usar máscaras. Ele me vê exatamente como sou.
Nas minhas leituras bíblicas e na minha própria vida vejo que a constante do relacionamento do Homem com Deus é essa: uma criatura imperfeita sendo moldada e amada por um Criador perfeito. Eu não sou perfeita, nem quero passar essa imagem ao mundo, pois a perfeição é uma máscara. Despida diante de Deus, confesso tudo o que é feio em mim. Imploro por sua graça e perdão. Imploro para que Ele me ajude a mudar o que precisa ser mudado em mim, a moldar meu caráter, me tornar mais parecida com Ele.
O que vale mais? Se iludir e achar que está tudo sempre perfeito e carregar uma máscara impecável? Ou assumir a imperfeição, despir-se, voltar-se para Deus e em Seus braços de graça enfrentar o processo doloroso da mudança? Por mais difícil que seja, eu prefiro assumir minha feiura e deixar que Deus me transforme. É necessário deixar o outono e o inverno seguirem seu curso, para que a primavera e o verão possam vir. É necessário olhar para dentro e confrontar nossa própria feiura, nosso próprio pecado. É necessário reconhecer que não somos perfeitos. É necessário sentir a dor ao assumirmos que não somos tão bons quanto imaginamos.
Pensando em tudo isso na minha pequena cozinha, entendi que ser cristão não é ser perfeito a cada segundo. Isso é impossível!
Ser cristão é arrancar a máscara, é deixar as folhas caírem. Ser cristão é assumir a imperfeição, mas entender que a vida é uma constante mudança, um constante aperfeiçoamento. É tentar a cada dia ser melhor. É aceitar que as estações vêm e vão. É entender que somente Ele é perfeito. É olhar para o desenho das minhas veias azuis e ver, sim, pecado correndo junto com meu sangue, mas tendo a certeza de que o sangue de Jesus me cobre com Seu perdão e graça.
Sou imperfeita, sou humana, sou pecadora, sou mutante, sou perdoada, sou amada, sou restaurada. Deixa que as folhas caiam e que os galhos fiquem feios e vazios. Não tem problema. Abraço esse processo doloroso e me rendo à disciplina amorosa do meu Pai e oro para que a minha imperfeição e meu constante processo de mudança sejam espelho para a graça de Deus nesse mundo quebrado.
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